PLR: O que mudou com as novas regras da Lei 14.020/2020.

Eduardo de Lucas / Direito Trabalhista
11 maio, 2021

A Participação nos Lucros ou Resultados, ou simplesmente PLR, é uma ferramenta utilizada no planejamento estratégico das empresas. Em resumo, tem como objetivo aumentar a lucratividade da empresa ao passo em que simultaneamente incrementa a remuneração dos colaboradores. Deste modo passa a ser um método de engajamento da equipe com as metas organizacionais, garantindo uma contínua melhoria nos processos da empresa.

No entanto, historicamente, a implementação de programas de PLR tem encontrado diversos obstáculos, dentre eles é possível citar i) a resistência dos Sindicatos em participarem nas negociações e formação das comissões; e ii) o posicionamento restritivo do Fisco ao não reconhecer a validade dos programas de PLR, descaracterizando a natureza indenizatória e praticando cobranças de contribuições previdenciárias.

Ambas estas ocorrências acabaram se tornando mecanismos que desencorajavam a implementação dos programas de PLR, de tal modo que somente era visto em grandes corporações.

Em meados de abril de 2020 o Governo editou a – já familiar – Medida Provisória nº 936 (atual Lei 14.020/2020) que trouxe alternativas trabalhistas, com o intuito de minimizar os impactos financeiros decorrentes da pandemia do Coronavírus.

No meio disso tudo, entre pandemia e votações, diversas emendas parlamentares acabaram sendo incluídas na Medida Provisória. Uma dessas inclusões trouxe sensíveis alterações na Lei 10.101/00, que trata – justamente – sobre a Participação nos Lucros ou Resultados, a exemplo da possibilidade de múltiplos programas e a prevalência do que for negociado entre as partes em detrimento de terceiros – leia-se Fisco e Sindicatos, assunto que já tratava a revogada Medida Provisória nº 905/2019 – aquela que foi ficou conhecida como a “mini” reforma trabalhista.

Esta nova redação, contudo, foi vetada pelo Governo sob a alegação de que as medidas acarretariam renúncia de receita sem o respectivo cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória, ou seja, o Governo perderia receita (renúncia fiscal) sem que houvesse uma contrapartida.

No entanto o veto presidencial foi derrubado pelo Congresso Nacional, que optou por manter a redação que trata das alterações nas regras dos programas de participação nos lucros ou resultados.

O mote destas alterações foi o de clarificar o texto legal, reduzindo as divergências interpretativas da Lei 10.101/00, trazendo maior segurança jurídica às partes, principalmente em relação a terceiros, pois como já apontado, o Fisco costumava surpreender as empresas ao desqualificar a natureza indenizatória das verbas relativas ao PLR, encaminhando cobranças de contribuições previdenciárias, acrescidas de multas e juros, inclusive.

Vale lembrar que ainda não está pacificado se as novas regras se aplicam a casos anteriores à lei, há quem defenda o caráter restritivo, isto é, que não possam não podem ser aplicadas em casos pretéritos, por outro lado existe quem defenda a ampla aplicação, já que as novas regras possuem caráter interpretativo.

Mas o que muda?

Se fosse possível sintetizar as alterações trazidas pela Lei 14.020/20 em uma única palavra, definitivamente ela seria  “clareza”, pois é justamente isto que estas alterações significam. Ou seja, trata-se de esclarecimentos e complementos acerca de pontos que há tanto tempo foram objeto de entraves e discussões, que irremediavelmente acabavam tornando-se um passivo e uma dor de cabeça aos empresários e também aos próprios colaboradores.

Para ilustrar isto, basta uma breve análise acerca das decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). A título de exemplo vejamos a seguinte notícia veiculada pelo Valor Econômico [1] em 22/07/16 “Carf define que plano de PLR deve ser assinado antes do período de apuração”.

A notícia informa acerca de uma decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) em um processo envolvendo a Alcoa Alumínimo e o banco de investimentos Credit Suisse. Nela se determina que os pagamentos de PLR somente possuem isenção de encargos trabalhistas e previdenciários se os acordos forem assinados antes do período de apuração.

Esta decisão representa uma brusca mudança de entendimento, haja vista que em decisões anteriores, para a comprovação da natureza indenizatória, bastaria que as empresas comprovassem que procuraram o Sindicato, que se manteve inerte, atrasando a formalização do acordo, que por conta disso, foi assinado somente durante o período do exercício.

Ressalte-se que neste caso a discussão envolvendo o banco de investimentos Credit Suisse trata da descaracterização da natureza indenizatória e consequente cobrança o recolhimento previdenciário acerca de um pagamento de US$ 2 milhões, relativo a um hiring bônus realizado em 2008, para que determinado executivo permanecesse até na empresa até 2009.

Dessa forma, é neste cenário de incerteza que a nova redação da lei da participação nos lucros ou resultados chega para trazer maior segurança jurídica. Estas alterações serão abordadas a seguir:

Entidades Sem Fins Lucrativos

A primeira mudança a ser abordada trata da inclusão do parágrafo 3º-A ao artigo 2º da Lei da PLR, que autoriza tanto os empregadores pessoas físicas ou as entidades sem fins lucrativos negociarem acordos de participação em lucros ou resultados com seus empregados, quando a PLR não resultar de índices relacionados à lucratividade, ou seja, deverão ser utilizados indicadores de produtividade, qualidade, metas, resultados e prazos.

§ 3º-A. A não equiparação de que trata o inciso II do § 3º deste artigo não é aplicável às hipóteses em que tenham sido utilizados índices de produtividade ou qualidade ou programas de metas, resultados e prazos”.

Anteriormente as entidades sem fins lucrativos estavam impossibilitadas de implementar programas de PLR. Este entrave existia, pois, dada a sua natureza, estas instituições não visam lucro. No entanto, tal como uma empresa comum, as entidades sem fins lucrativos podem apresentar um superávit ou mesmo um déficit em suas contas.

Deste modo, a nova redação da Lei da PLR veio por um fim nesta discussão, autorizando entidades sem fins lucrativos de promoverem programas de PLR, desde que sejam utilizados índices diversos da lucratividade.

Múltiplos Programas de PLR e Periodicidade

Em seguida há a introdução do inciso II do parágrafo 5º ao artigo 2º da Lei da PLR, que autoriza a implementação de mais de um programa de PLR:

II – estabelecer múltiplos programas de participação nos lucros ou nos resultados, observada a periodicidade estabelecida pelo § 2º do art. 3º desta lei”.

Todavia, os programas de participação nos lucros ou nos resultados deverão respeitar a periodicidade dos prazos de pagamentos já previstos em lei, ou seja, com até 2 distribuições no mesmo ano, separadas pelo período de no mínimo um trimestre.

Cabe pontuar que, anteriormente, muitas empresas eram alvo de fiscalizações e eventualmente de autuações pelo Fisco, que não admitia múltiplos programas e, por conta disso, sustentava descaracterização da natureza indenizatória de todo a PLR.

Prevalência da Negociação Entre as Partes

A terceira mudança, possivelmente uma das mais relevantes, é a introdução do parágrafo 6º ao artigo 2º da Lei da PLR, que estabelece a prevalência da negociação entre as partes, inclusive sobre o interesse de terceiros.

§ 6º Na fixação dos direitos substantivos e das regras adjetivas, inclusive no que se refere à fixação dos valores e à utilização exclusiva de metas individuais, a autonomia da vontade das partes contratantes será respeitada e prevalecerá em face do interesse de terceiros”.

Isto significa que o novo texto privilegia o que foi negociado entre as partes, prevalecendo sobre o interesse de terceiros (leia-se Fisco/Sindicatos), inclusive.

Ainda que o termo “terceiros” utilizado pelo legislador possa parecer um tanto subjetivo, trata-se de uma regra claramente direcionada para afastar o posicionamento restritivo por parte do Fisco que, lembrando, acabava por autuar diversas empresas pela suposta falta de recolhimentos previdenciários, sustentando que os programas não atendiam aos requisitos dispostos na Lei da PLR, em especial no artigo 2º, parágrafo 1º, que dizia:

os instrumentos decorrentes da negociação deverão constar regras claras e objetivas quanto à fixação dos direitos substantivos da participação e das regras adjetivas, inclusive mecanismos de aferição das informações pertinentes ao cumprimento do acordado, periodicidade da distribuição, período de vigência e prazos para revisão do acordo, podendo ser considerados, entre outros, os seguintes critérios e condições[2].

Fato é, que o Fisco se aproveitava dos termos vagos do texto da Lei da PLR, para justificar a descaracterização da natureza indenizatória dos pagamentos efetuados a título de PLR na folha de pagamento.

A nova redação traz firmeza à Lei da PLR, estabelecendo que as disposições negociadas no programa irão prevalecer sobre o interesse de terceiros, o que significa que as partes poderão dispor de direitos próprios, negociar a fixação de valorares e inclusive a utilização de metas individuais ou direcionadas a determinado setor, como por exemplo aos cargos operacionais ou gerência.

Momento de Assinatura do Acordo de PLR

Antes da nova redação da Lei da PLR, havia diversas discussões sobre qual seria o momento para que o acordo da PLR fosse assinado, pois que a antiga redação não trazia nada a respeito.

Por conta disso, dependia-se do posicionamento jurisprudencial do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), onde predominava o entendimento de que os programas de PLR devem ser assinados antes do exercício, porém, em decisões anteriores, bastava que a empresa comprovasse o contato prévio com o Sindicato para que o acordo pudesse ser assinado no decorrer do exercício, tornando mais difícil o afastamento da incidência da contribuição previdenciária.

No entanto, o novo texto agora estabelece precisamente o momento da formalização do programa de PLR, inserindo o parágrafo 7º no artigo 2º da Lei da PLR:

§ 7º Consideram-se previamente estabelecidas as regras fixadas em instrumento assinado:

I – anteriormente ao pagamento da antecipação, quando prevista; e

II – com antecedência de, no mínimo, 90 (noventa) dias da data do pagamento da parcela única ou da parcela final, caso haja pagamento de antecipação”.

Isto é os pagamentos de PLR somente são válidos, e, portanto, isentos dos encargos trabalhistas e previdenciários, se o acordo foi assinado: i) anteriormente ao pagamento ou antecipação da PRL; ou ii) no prazo de até 90 dias antes da parcela final da PLR.

Na prática isto representa uma grande melhoria e segurança na implementação de um programa de PLR, uma vez que a fase de negociação do programa costuma levar um grande período de tempo, já que são diversos critérios e requisitos a serem observados, inclusive em relação ao momento em que a empresa se encontra. Por conta disso, em muitos casos o acordo acabava sendo assinado somente durante o próprio ano de exercício. Com isso a validade dos programas de PLR sujeitava-se aos entendimentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Participação do Sindicato

A nova redação da Lei da PLR também trouxe o entendimento de que a participação do sindicato nas negociações, antes imprescindível, não é mais um requisito de validade do programa.

É o que diz o § 10º do artigo 2º da Lei da PLR:

§ 10. Uma vez composta, a comissão paritária de que trata o inciso I do caput deste artigo dará ciência por escrito ao ente sindical para que indique seu representante no prazo máximo de 10 (dez) dias corridos, findo o qual a comissão poderá iniciar e concluir suas tratativas”.

Isto é, após a formação da comissão paritária (mesmo número de representantes da empresa e dos empregados) o sindicato será notificado para que no prazo de 10 dias corridos indique o seu representante. Decorrido este prazo, e tendo o sindicato permanecido em silêncio, a comissão poderá dar seguimento ao acordo de PLR.

Cabe apontar que anteriormente à nova redação da Lei, não eram raras as vezes em que o Sindicato, ao ser convidado para participar das comissões da PLR, criava empecilhos para prejudicar o andamento das negociações, sequer respondendo ao convite, o que acabava deixando a empresa e os empregados sem alternativas para formalizar o acordo.

Com isso a situação ficou clara, ao ser convidado, o sindicato terá 10 dias corridos para indicar seu representante, caso não o faça, o acordo poderá prosseguir normalmente até a sua conclusão.

Conclusão

As alterações legislativas acerca da Participação nos Lucros ou Resultados propostas pela Lei 14.020/20, já estão valendo desde 6 de novembro de 2020, e vêm em um bom momento, para trazer segurança jurídica aos Empresários que desejam implementar programas de PLR.

Não há mais tanto aquela inquietude causada pelas fiscalizações e autuações do Fisco que motivaram a aplicação de multas milionárias, com invalidações de programas de PLR, quer seja em razão da data de assinatura posterior ao início do exercício, quer seja pelo descumprimento da periodicidade legal, ou por motivos outros.

A crise econômica vivenciada por conta da pandemia do Coronavírus é cercada de incerteza, e somente poderá ser superada através do empenho e da criatividade. Um programa de Participação nos Lucros ou Resultados nada mais é que uma ferramenta, que quando utilizada da forma correta, é capaz de atingir o objetivo almejado.

Em conclusão, as modificações e flexibilizações introduzidas nas regras da Lei da Participação nos Lucros ou Resultados certamente ainda serão tema de muitos debates e judicializações. Porém o jogo virou, revelando um cenário favorável para a implementação destes programas, garantindo esta vantagem competitiva a toda e qualquer empresa que busca um posicionamento diferenciado no mercado.

 

 

[1]  Acesso em 07/05/21. Disponível em: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2016/07/22/carf-define-que-plano-de-plr-deve-ser-assinado-antes-do-periodo-de-apuracao.ghtml

[2]  Os grifos não constam do original.

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