Aspectos Trabalhistas na Elaboração do Contrato de Prestação de Serviços

Eduardo de Lucas /
28 abril, 2023

Contratos para prestação de serviços, sejam de autônomos ou pessoas jurídicas, são uma importante ferramenta na gestão de recursos e departamento pessoal. Isto porque é muito comum o surgimento de determinadas demandas que necessitam de um approach mais especializado, ou mesmo que, por conta da disponibilidade – leia-se tempo, não podem ser absorvidas pela equipe interna.

É importante pontuar que o profissional que opta por trabalhar como pessoa jurídica ou autônomo, não possuirá a tradicional segurança/conforto e direitos que estão resguardados na Consolidação das Leis do Trabalho. Por outro lado, este modelo de trabalho traz diversas vantagens ao profissional que possua um perfil mais arrojado e disposto a assumir riscos.

Isto porque, ao aderir a este modelo, o profissional vai garantir diversas vantagens, dentre elas:

  • flexibilidade de horários: este profissional é dono de sua própria agenda, uma vez que não possui a necessidade de cumprir com uma jornada de trabalho;
  • flexibilidade de projetos: por atuar de forma independente, este profissional pode atender a diversas empresas, selecionando os projetos que melhor se adequam aos seus interesses;
  • remuneração superior: o salário celetista é repleto de descontos obrigatórios, tal qual a contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que pode variar entre 7,5% a 14%, a depender do salário bruto, e o Imposto de Renda, cuja alíquota varia entre 7,5% a 27,5%. Por outro lado, a remuneração do profissional independente não sofre com estes descontos, o que possibilita às empresas oferecerem remunerações em torno de 40% superiores em relação aos tradicionais salários celetistas.

No entanto, ainda que este cenário se revele uma verdadeira win-win situation, é importante frisar que esta modalidade de contratação deve ser realizada com grande cautela, especialmente por conta do risco de que, a depender de certas condições, possa ser caracterizado o vínculo de emprego entre a empresa e o prestador de serviços.

Foto de Alexander Suhorucov

Isto ocorre, pois, no entendimento dos Tribunais Regionais do Trabalho prevalece o princípio da primazia da realidade sobre a forma. Isto significa que um eventual contrato realizado entre determinada empresa e prestador de serviço, ainda que possua cláusulas que expressamente afasta o vínculo de emprego, isto por si só, não afasta a natureza da relação que houve entre as partes, devendo o Juízo observar o que ocorreu de fato durante a contratualidade.

O vínculo de emprego, neste caso, sugere que a relação entre a empresa e o prestador de serviços foi mantida sob os requisitos expostos no artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, sendo eles:

  • pessoalidade: o empregado é insubstituível, isto é, não pode colocar outra pessoa para trabalhar em seu lugar;
  • onerosidade: os serviços prestados pelo empregado serão realizados mediante pagamento;
  • não-eventualidade: significa que o trabalho será realizado de forma contínua, ou seja, não pode ser esporádico/ocasional;
  • subordinação: o empregado deve estar submetido aos comandos e ordens do empregador.

Diante disso, a empresa que opta por contratar prestadores de serviço autônomos ou pessoas jurídicas, deve ter em mente que, além de um contrato forte, adequado e personalizado a cada situação, é necessário que sejam tomadas precauções durante a contratualidade, para garantir que a relação entre empresa e prestador de serviço, não possa vir a ser caracterizada como um vínculo de emprego.

Nesse sentido, já que a empresa não poderá dar ordens ou mesmo exigir o cumprimento de horários do prestador de serviço – sob pena da caracterização do famigerado vínculo de emprego, tal qual o faz com os empregados celetistas, é muito importante a formalização de um bom contrato para garantir a qualidade do projeto, evitando assim uma futura dor de cabeça além de um eventual passivo trabalhista.

Sendo assim, quais são as cláusulas “base” que, no aspecto trabalhista, seria importante constar no contrato de prestação de serviços?

Antes de adentrarmos às cláusulas básicas do contrato de prestação de serviços, é importante fazer um breve comentário acerca das cláusulas obrigatórias. Isto é, o contrato deve obrigatoriamente conter os itens do artigo 5º-B da Lei nº 6.019/74, cuja redação foi dada Lei nº 13.429/17, mais conhecida a nova Lei da Terceirização, ou seja:

  • Qualificação das partes: Em primeiro lugar é essencial a qualificação das partes, inserindo os dados de ambas as partes (contratante e prestador de serviços);
  • Escopo do serviço que será prestado: Nesta etapa é conveniente descrever minuciosamente todas as atividades que serão realizadas pelo prestador, inclusive com a especificação de dados técnicos, de modo que fique claro o que deverá ser cumprido durante a contratualidade, definindo os prazos e objetivos;
  • Prazo para a realização da prestação de serviços, quando for o caso: Aqui será estabelecido o prazo do contrato de prestação de serviços, que poderá ser por prazo determinado ou indeterminado. Lembrando que, de forma geral, o contrato de prestação de serviços não pode ultrapassar o prazo de 4 anos (artigo 598 do Código Civil). Porém, cabe pontuar que isto não significa que ao final deste prazo as partes não possam renovar o contrato por outro período, ou mesmo celebrar um contrato por prazo indeterminado, desde que seja viabilizada a rescisão contratual unilateral e imotivada a qualquer tempo;
  • Valor: Por fim, um contrato de prestação de serviços, obrigatoriamente deve conter o valor/preço a título de contraprestação dos serviços prestados. Nesta cláusula é importante estabelecer as condições de pagamento gerais de pagamento, tal qual a periodicidade, como serão realizados os pagamentos, ou mesmo se o pagamento será realizado somente após a entrega do projeto, dentre outros itens que devem ser validados caso a caso.

Foto de Tima Miroshnichenko

Estas são as cláusulas obrigatórias em um contrato de prestação de serviços, porém, além delas, para assegurar um bom contrato de prestação de serviços também podem ser negociadas outras cláusulas “base”, que podem vir a garantir uma maior segurança jurídica entre as partes, além de trazer maior confiabilidade e qualidade para a realização do projeto.

  • Definição das obrigações da contratante: as obrigações da contratante devem ser definidas antecipadamente. No geral, nesta etapa pode ser estabelecida a necessidade da contratante em fornecer eventuais subsídios e demais informações para assegurar a realização do projeto, e também que o pagamento ao prestador de serviço deverá ser realizado nas condições estipuladas no contrato;
  • Definição das obrigações do contratado: Semelhante à cláusula anterior que estabelece as obrigações da contratante, as obrigações do prestador de serviço devem ser claras. Aqui é importante registrar que a prestação de serviços deverá ser adequada aos termos e parâmetros de qualidade estabelecidos em contrato. Também pode ser estabelecido meios que autorizem a contratante solicitar o envio de relatórios e demais documentos para que possam viabilizar a fiscalização do cumprimento do contrato;
  • Reajuste: Quando estamos diante de um contrato de longo prazo, ou seja, com duração superior a 1 ano, é conveniente estabelecer uma cláusula de reajuste dos valores, para que o contrato permaneça equilibrado financeiramente ao longo do tempo. Neste caso, podem ser estabelecidas cláusulas que permitam que o reajuste seja realizado através de negociações ou pela aplicação de um índice de correção monetária;
  • Rescisão contratual: A rescisão do contrato é um pressuposto estipulado pela legislação. Entretanto, isto não impede que as partes possam negociar cláusulas de resilição de acordo com seus próprios interesses e características dos serviços prestados. Em vários casos, o contrato pode ser rescindido, seja no final da vigência ou devido à plena execução do serviço contratado, por vontade de ambas as partes, ou ainda em decorrência do descumprimento dos termos do acordo. É importante destacar quais são os cenários de extinção do contrato, qual será a forma que isto ocorrerá e quais serão as consequências da resilição;
  • Multa contratual: Na hipótese de violação dos termos estipulados no contrato, é importante estabelecer a incidência de multa, devendo constar qual a forma que serão aplicadas as eventuais sanções;
  • Despesas: Em determinados projetos pode vir a ser necessária a contratação de mão de obra, ou mesmo a compra com materiais necessários para a execução dos serviços. Por conta disso, é importante estabelecer de forma clara quem será o responsável por este tipo de despesa;
  • Assinatura por 2 (duas) testemunhas: Em conformidade com o artigo 784, inciso III do Código de Processo Civil, para que o contrato possua a eficácia de um título executivo extrajudicial, é necessário que o contrato possua a assinatura de 2 testemunhas;
  • Foro competente: Esta cláusula é importante para definir o foro competente para a resolução de disputas, para evitar custos excessivos se houver a necessidade de judicialização;
    Disposições gerais: trata-se de uma cláusula de encerramento que dispõe sobre o que não foi estabelecido anteriormente no contrato, via de regra determinar que as condições do contrato somente passarão a ter efeito após a assinatura por ambas as partes.

Foto de Tiger Lily

E quais são as cláusulas “plus” que seriam interessantes constar no contrato de prestação de serviços?

Outras questões podem surgir devido às particularidades de cada projeto/serviço, deste modo é relevante a elaboração de cláusulas mais específicas para atender as necessidades de cada caso.

  • Adequação à LGPD: No decorrer da contratualidade haverá inevitavelmente a troca de dados pessoais entre as partes, como por exemplo na celebração do contrato de prestação de serviços entre pessoas jurídicas, quando existe o acesso a dados societários, tal como eventuais estatutos sociais e contratos sociais. Por conta disso, é necessária a elaboração de cláusulas, estabelecendo as responsabilidades de cada uma das partes, com regras claras que deverão ser seguidas no cumprimento da LGPD;
  • Propriedade Intelectual, Autoral ou Industrial: É importante que o contrato de prestação de serviços já antecipe a definição de quem será o titular dos direitos de propriedade industrial, autoral ou intelectual, que estiverem relacionados com os serviços prestados. Isto se deve, pois durante a contratualidade, a depender do tipo de projeto, podem ser desenvolvidos softwares, códigos-fonte, design, algoritmos, dentre outros.
  • Uso de Imagem: Uma cláusula para assegurar a cessão do uso de imagem, nome ou voz, é especialmente importante, considerando que muitas vezes está intrinsecamente ligado à conclusão do projeto, exemplo disso, é a contratação de profissionais que desenvolvem cursos, workshops. Neste tema, é muito relevante também já dispor sobre o uso desses direitos de personalidade, após o encerramento da prestação de serviços, no intuito de afastar eventuais alegações de que a contraparte não deseja mais ter a sua imagem vinculada a determinado projeto.
  • Confidencialidade: Durante a vigência do contrato de prestação de serviços, é possível que o contratado se depare com informações classificadas como confidenciais, envolvendo questões financeiras, comerciais, know-how, estratégia de negócios e de mercado, dentre outros. Por conta disso, é importante estabelecer que a utilização dessas informações deve se restringir ao escopo do objeto da prestação de serviços, estabelecendo-se, inclusive, a incidência de multa pelo descumprimento.

Estas são apenas alguns exemplos de cláusulas que podem vir a integrar o contrato de prestação de serviços. Sendo assim, é recomendável que durante a elaboração do contrato a empresa esteja acompanhada de uma assessoria especializada, principalmente na fase pré-contratual onde são realizadas as negociações, permitindo a antecipação de eventuais particularidades do projeto.

Para concluir, é importante relembrar que, sob o aspecto trabalhista, é irrelevante que o contrato de prestação de serviços estabeleça cláusulas que prevejam a inexistência do vínculo de emprego. Deste modo, considerando que a empresa não poderá dar ordens ou mesmo exigir o cumprimento de horários do prestador de serviço, para que se possa assegurar juridicamente a qualidade de determinado projeto/serviço, é importante a elaboração de cláusulas de acordo com as particularidades do negócio.

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