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M&A? O que é isso?
Com o intuito de consolidar e expandir seus negócios, escalonar seus resultados, ampliar seu know-how, e conquistar novos mercados, muitas empresas recorrem às operações de M&A, ou, em bom português, de fusões e aquisições.
Essa expressão, traduzida literalmente do inglês “mergers and acquisitions”, refere-se ao conjunto de operações societárias com cisão, incorporação, fusão, compra e venda de participação na empresa. É por meio desse tipo de procedimento que empresas se unem, se separam ou adquirem participações em outras menores ou do mesmo porte.
Cada um desses tipos de operação tem suas características e particularidades. Por exemplo, a incorporação, uma das mais comuns, se dá quando a empresa A é adquirida pela empresa B e deixa de existir. A fusão, por sua vez, é menos usual, e consiste na união entre empresa A e B para constituir uma empresa C, de modo que as duas primeiras não existirão mais. Já a cisão consiste na divisão da empresa A, criando duas novas empresas – B e C.
Provavelmente, você já ouviu falar de alguma empresa famosa que adquiriu uma outra, ou de duas empresas grandes que se juntaram. Mas engana-se quem pensa que essas operações se restringem apenas a corporações de maior porte e a transações na casa das centenas de milhões. Cada vez mais, pequenas e médias empresas, e até mesmo startups, têm enxergado as operações de M&A como ótimas alternativas para agregar valor a seus negócios.
Independentemente de envolverem, ou não, empresas milionárias, as operações de fusão e aquisição são bastante complexas, recomendando-se que sejam acompanhadas do início ao fim por profissionais com expertise no assunto.
Aliás, antes da assinatura do contrato final, há diversas etapas envolvidas, como a assinatura de memorandos de entendimentos, acordos de confidencialidade, procedimentos de auditoria, negociação, entre outras que requerem bastante atenção e conhecimento jurídico para que não comprometam negativamente as partes envolvidas.
Inclusive, em muitos casos, no decorrer de uma operação de fusão, aquisição ou incorporação, pode ser necessária a alteração do tipo societário das empresas envolvidas, ou seja, a forma como a sociedade empresária é constituída.
Isso significa dizer, por exemplo, que a empresa A, constituída como sociedade anônima, pode se tornar uma sociedade limitada ao ser incorporada pela B em uma operação de M&A.
Mas, na prática, o que isso muda? Muita coisa!
Os dois tipos de estrutura mais comuns para a constituição de sociedades empresárias são a sociedade por ações, também conhecida como sociedade anônima, e a sociedade limitada.
Apesar dessa diferenciação, não há, regra geral, na lei brasileira, uma previsão que determine por qual tipo societário uma determinada empresa ou atividade deve ser constituída, de modo que a formatação jurídica da sociedade é, a princípio, uma livre escolha dos sócios. Na verdade, há poucas exceções a essa regra geral, como por exemplo:
- Sociedades de Agentes Autônomos de Investimento que, ao menos por enquanto, precisam se organizar como sociedades não empresariais (e, portanto, não podem ser S/A);
- Fintechs constituídas como ESC (Empresas Simples de Crédito) devem se organizar como sociedades empresárias limitadas, e não podem ser S/A;
- Fintechs constituídas como SCD (Sociedade de Crédito Direto) só podem se organizar como S/A;
- Sociedades Profissionais, como as de advocacia, que precisam ser sociedades não empresárias simples, dentre outras exceções;
Porém, existem algumas características inerentes a cada um dos tipos que podem tornar um ou outro mais adequado para uma empresa.
As sociedades anônimas (S/A) são regulamentadas por uma lei específica, que estabelece regras mais rígidas em relação à estrutura e aos direitos dos acionistas. Enquanto isso, as limitadas são regidas, em regra, pelo Código Civil. Existem algumas questões em que a Lei das S/A pode ser aplicada às sociedades limitadas, desde que sejam respeitados os princípios do da legislação civil.
Um dos pontos principais a serem observados ao analisar qual o tipo societário ideal para ser utilizado em uma operação de M&A é referente à Administração.
Em uma sociedade anônima, a administração pode ser exercida exclusivamente pela diretoria ou em conjunto com o Conselho de Administração, cujos cargos devem ser ocupados por tempo determinado, obedecendo a uma rotatividade. Importante ressaltar, também, que a própria lei estabelece como devem ser compostos esses órgãos administrativos e lhes atribui as competências.
A administração de uma sociedade limitada, por sua vez, é bem mais simplificada, podendo ser exercida por apenas uma pessoa e por tempo indeterminado. Também podem ser criados conselhos fiscal e de administração, a exemplo das S/As, embora não sejam alternativas tão usuais na realidade do mercado.
Quanto à prestação de contas, o administrador da sociedade limitada tem obrigações um pouco mais genéricas e flexíveis, enquanto o da sociedade anônima deve fazê-la de forma mais detalhada, em atendimento à legislação.
Uma outra diferença essencial entre esses dois tipos societários é no que tange à Distribuição de Lucros. Em se tratando da sociedade limitada, os lucros geralmente são distribuídos aos sócios de forma proporcional a sua participação no cap table. Porém, pela lei, não existe nenhum empecilho para que a distribuição se dê de maneira desproporcional, desde que devidamente estabelecido em contrato. Contudo, a lei veda expressamente a exclusão de qualquer sócio da distribuição dos lucros.
No caso da sociedade anônima, existe uma previsão legal sobre a reserva de lucros, determinando inclusive o percentual que a constituirá – 5% do lucro líquido daquele exercício. A lei também prevê a obrigatoriedade da distribuição de dividendos a cada exercício, conforme o previsto em estatuto ou, caso não haja menção, conforme a legislação. Em regra, a distribuição dos lucros em uma sociedade anônima se dá de maneira proporcional à participação de cada um dos acionistas, mas é possível determinar que alguns recebam mais, e outros menos, por meio da criação das chamadas “ações preferenciais”.
Essas ações preferenciais e seus subtipos estão entre as espécies de ações que podem ser emitidas por uma sociedade anônima, e são concedidas determinadas vantagens aos acionistas que as detém, como no direito ao voto e na distribuição dos lucros. As ações ordinárias também integram esse rol de ações, juntamente com as classes dela derivadas, e podem também gerar direitos e restrições aos quotistas.
A aplicação de tal divisão em classes para as quotas ainda é nebulosa e indefinida no âmbito das sociedades limitadas, pois apesar de existir uma possibilidade de normatização da criação de quotas preferenciais, há bastantes controvérsias sobre o tema, de modo que pode haver uma insegurança jurídica.
Há, também, diferenças relevantes com relação às formas de saída dos sócios nos dois formatos de sociedade
Se um sócio, por qualquer razão, decidir se retirar de uma sociedade limitada, poderá fazer isso a qualquer momento mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias. Para isso, não é exigida justa causa, a não ser que se trate de uma sociedade constituída por prazo determinado, o que é uma opção menos usual. De toda forma, em qualquer um dos casos, o sócio que se retirar terá direito a receber os haveres referentes a sua participação no capital social.
Já nas sociedades anônimas, essa questão não funciona da mesma forma. Mais uma vez, a questão é mais engessada, de forma que o sócio só pode se retirar da companhia e pedir reembolso do valor de suas ações em caso de dissidência, nas hipóteses previstas pela lei. Ou seja, é garantida ao acionista sua retirada, mediante recebimento dos haveres, sempre que for vencido em deliberação da companhia que acarrete em seu prejuízo, como a redução do dividendo obrigatório, alterações relevantes nas classes de ações, a aprovação de fusões, incorporações ou cisão da companhia, entre outras.
A exclusão de um sócio também é uma particularidade das sociedades limitadas, sendo possível mediante deliberação por maioria do capital social e, inclusive, de forma extrajudicial. Entretanto, essa possibilidade de exclusão por justa causa deve estar prevista no contrato social.
Para as sociedades anônimas, a exclusão de um quotista pode ser um pouco mais complexa, visto que não há previsão legal nesse sentido. A lei prevê apenas a responsabilização por atividade ilícita, abusiva ou que prejudique efetivamente a sociedade, o que, na prática, pode gerar algumas consequências como exclusão por recompra das ações.
Embora já existam, na jurisprudência, precedentes de exclusão de sócio pela via judicial, esse ainda é um tema bastante controverso.
De modo geral, podemos considerar que a sociedade anônima é uma sociedade de capital, o que justifica sua regulação mais sistemática, enquanto a limitada é uma sociedade de pessoas, pautada na confiança.
Além de todas essas questões de governança corporativa, a alteração do tipo societário de uma empresa que passou por uma operação de fusão e aquisição pode também influenciar muito no regime tributário a ser adotado e, consequentemente, nos impostos com os quais a sociedade deverá arcar.
Diante de todas essas particularidades de cada tipo societário, fica claro que, para escolher a forma ideal para uma empresa após uma operação de fusão e aquisição, é necessário um olhar atento e aprofundado para a realidade do negócio, principalmente acerca da relação que se pretende estabelecer entre os sócios.