Escritório com Prazo de Permanência Mínima de Exclusividade com a Corretora. Riscos e como Tratá-los
O Contrato de Distribuição é o principal documento que regula o relacionamento entre Distribuidoras (DTVM) ou Corretoras (CTVM) e escritórios Agentes Autônomos de Investimento (AAI).
Inicialmente esses contratos são assinados por prazo indeterminado. Ou seja, sem prazo definido para terminar, mas que pode ser finalizado (tecnicamente, “resilido”) por qualquer dos lados, mediante aviso prévio.
No cenário regulatório atual, os escritórios vinculam-se em caráter de exclusividade, de modo que, uma vez firmado um contrato com uma Corretora, os assessores não podem prospectar clientes e oferecer produtos distribuídos por outras distribuidoras ou corretoras.
Com o aumento da concorrência do mercado, surgimento e crescimento de outras Corretoras, com apetite para expandir e capilarizar redes de AAI, os escritórios passaram a ser assediados para mudar de “bandeira”; ou seja, desvincular-se de determinada Corretora, e passar a distribuir produtos para a Corretora concorrente.
Nesse contexto, as Corretoras movimentaram-se para proteger suas bases de escritórios. Uma das ações foi a de aportar incentivos financeiros em escritórios da rede para, ao mesmo tempo, vinculá-los em longos Períodos de Permanência Mínima (por exemplo, 10 anos).
Os incentivos financeiros permitem aos escritórios investir na expansão e na melhoria da qualidade dos serviços; em contrapartida, a permanência mínima diminui a volatilidade nas trocas entre as “bandeiras” de Corretora.
Habitualmente, essas negociações costumam ser formalizadas por meio de aditamentos aos Contratos de Distribuição, e são assinados pela Corretora, pelo escritório, e pelos principais assessores do escritório. Nesse documento, as Corretoras costumam estabelecer penalidades severas em caso de desvinculação do escritório, ou dos seus principais assessores, antes do decurso do Período de Permanência Mínima.
Regra geral, nesses acordos, os escritórios (CNPJ) se responsabilizam por fazer com que os seus assessores (CPF) cumpram o combinado com a Corretora. Se houver descumprimento pelos assessores (CPF), o escritório (CNPJ) é que será penalizado com multas altíssimas.
Por exemplo, se um dos principais assessores (CPF) descumprir a permanência mínima, e migrar para um escritório da concorrência, o escritório o (CNPJ) poderá ter que pagar uma multa milionária à Corretora, nos termos do acordo assinado.
A pergunta é: como fazer para diminuir esse risco?
Felizmente, existem ferramentas contratuais e societárias para tratar esse risco. Importante afirmar: normalmente, não é suficiente um acordo de sócios padrão. Recomenda-se, depois da formalização do acordo de permanência mínima com a Corretora, adaptar o enxoval de documentos do Partnership para endereçar os riscos aumentados.
Esses mecanismos podem assumir, por exemplo, a forma das ferramentas contratuais mencionadas a seguir.
Vedação à Transferência de Quotas
Conhecida como cláusula de Lock-Up, sujeita os sócios de determinada sociedade ao chamado “período de lock-up”, durante o qual não poderão alienar, ceder, transferir, vender alugar ou negociar por qualquer forma as suas quotas ou os direitos de preferência para aquisição de novas cotas.
Em sociedades limitadas (todos sabemos da vedação de os escritórios de AAI se organizarem em S/A – pelo menos até sair o novo marco regulatório, em breve), o lock-up possui limitações. Não se pode proibir societária ou contratualmente, em caráter absoluto, a saída voluntária de um sócio em uma limitada por prazo indeterminado. Ou seja, a não ser que se use o artifício de estabelecer prazo (longo) para a existência do escritório, o lock-up nas limitadas precisa ser indireto, estabelecendo-se um grande desincentivo à saída voluntária durante o período de lock-up.
Assim, caso o sócio em lock-up retire-se da sociedade, perderá o direito de ter aplicados à sua participação critérios de avaliação ou valuation previstos no acordo de sócios ou contrato social. A sua participação será liquidada, com apuração de haveres, muitas vezes calculada com grande deságio.
Bem estruturadas, as cláusulas de bloqueio podem acautelar os escritórios de investimento da perda indesejada daqueles seus colaboradores que assumiram as obrigações previstas no contrato de distribuição. Decorrido o prazo de Lock-up, o sócio poderá dispor de sua cota, observando as demais restrições que se fizerem constar dos documentos societários.
Reforço da Exclusividade
Para reforçar a necessidade de cumprimento do Contrato de Distribuição, evitar saídas indesejadas e multa, o escritório de investimentos poderá, em acordo de sócios, regular de modo mais detalhado o vínculo de exclusividade.
Em resumo, durante o tempo em que estiver vinculado à cláusula de exclusividade, o AAI deverá permanecer pelo período mínimo como sócio do escritório, cadastrado perante a Corretora, exercendo sua função com dedicação exclusiva e integral, e não poderá celebrar qualquer contrato com outra concorrente (basicamente a prospecção e captação de clientes).
Além disso, poderão ser estabelecidas penalidades e responsabilidades em relação a eventuais perdas que o escritório vier a sofrer, como, exemplificativamente, penalidades que venham a lhe ser impostas pela Corretora por descumprimento motivado pelo assessor.
Não Competição, Não Solicitação e Não aliciamento
É importante verificar se o acordo de sócios contém cláusula de não concorrência, pela qual o sócio, após a ruptura do vínculo com a sociedade, não poderá participar, durante lapso temporal, de negócio que possa vir a concorrer com o explorado pelo escritório de investimentos, sob pena de multa, além de indenização, e tutela específica.
A cláusula de não solicitação, por sua vez, é aquela por meio de que o sócio se obriga a, durante certo tempo após sua saída da sociedade, não cooptar ou estabelecer qualquer relacionamento comercial com clientes da sociedade. Essa previsão pode desestimular as saídas antecipadas de colaboradores estratégicos do escritório.
Outra prática útil para esse modelo de negócio pode ser a inserção, no acordo de sócios, de cláusula de não aliciamento (No Hire), que poderá prevenir o escritório de investimentos contra o poder de persuasão que o sócio retirante poderia, eventualmente, exercer sobre outros membros da equipe. A cláusula funciona impedindo que o sócio, enquanto nessa condição, bem como durante determinado tempo após sua saída da sociedade, venha a aliciar, induzir ou convidar membros do antigo time a manter consigo vínculos negociais.
Todas essas cláusulas restritivas devem ser devidamente analisadas, de modo a justificar sua inserção e adequação aos contratos que regulam o negócio. Aspectos como, por exemplo, os períodos de vigência, a eficácia territorial, necessidade de remuneração, penalidades e cumulatividade de consequências, e os membros da equipe abrangidos – os quais, eventualmente, poderão ser definidos pela atividade desempenhada ou senioridade – requerem ajuste sob medida, de que poderá depender, inclusive, o reconhecimento da eficácia vinculativa das cláusulas.
Compromissos Particulares
A necessidade de se respeitar as obrigações de permanência mínima, de exclusividade e outras disposições podem ser reguladas, além de em acordo de sócios, em um compromisso particular apartado com o escritório de investimentos, assinado por cada sócio individualmente.
O compromisso pode ser firmado contemporaneamente à assinatura da negociação com a Corretora. Além do vínculo societário decorrente do Acordo de Sócios, podem-se replicar, aqui, mecanismos assemelhados com os que tiverem sido acordados na relação Corretora <> Escritório, de maneira a também estabelecer um vínculo específico de responsabilidade entre Escritório <> Assessor.
Os deveres de exclusividade, as disposições restritivas quanto à transferência de quotas, as cláusulas de bloqueio, não competição, não solicitação, não aliciamento, dentre outras, poderão ser mencionadas e até mesmo detalhadas no instrumento, para o fim de reforçar a necessidade de cumprir integralmente as condições do contrato de distribuição.
As hipóteses de rescisão contratual do contrato de distribuição podem ser mencionadas no compromisso, bem como poderão ser previstas multa, indenização, e também retenção e compensação com valores que o sócio deveria vir a receber do escritório (haveres relativos à participação societária, por exemplo). Isso confere segurança à negociação, já que o escritório, por seu lado, também responde perante a Corretora pelas violações contratuais dos sócios.
Partnership
Por fim, mas ainda no que diz respeito à retenção de assessores-chave do escritório de investimentos, é possível regular em acordo de sócios a adoção do programa de partnership; recurso que busca trazer o assessor para dentro da sociedade, como forma de fortalecer o espírito de equipe e engajamento.
A sociedade poderá instituir Comitê de partnership, com poderes para adquirir suas próprias cotas e emitir outras, para dar cumprimento ao estabelecido no programa; elaborar programas periódicos contratuais com a opção de compra do beneficiário; estabelecer ou esclarecer as regulamentações do programa, dentre outros.
Com efeito, o programa permitirá às partes – AAIs e o escritório de investimentos – engajar juntos em um trabalho para aumentar coletivamente o valor da empresa. Para mais informações sobre o partnership, que abrangem desde o modo de estruturação até seus instrumentos contratuais específicos, modo de entrada e saída, implicações tributárias, governança, desligamento e exclusão, vale a pena conferir o Especial Partnership, disponível em nosso site.