Contrato de trespasse: as 4 medidas necessárias para uma operação bem feita
Por Laila Gerdulli / Direito Societário / 14 julho, 2020
Conforme falamos nesse artigo Repasse de ponto: as vantagens e desvantagens de cada tipo de contrato, o contrato de trespasse é a maneira prevista na lei brasileira para formalizar um repasse de ponto – isto é, a compra de um estabelecimento comercial.
Para realizar esse contrato, no entanto, em contrapartida à segurança que ele oferece, é necessário observar algumas exigências legais. São elas:
Averbação do Contrato na Junta Comercial
O contrato de trespasse deve ser apresentado à Junta Comercial (JUCEPAR, no Paraná), no prazo de 30 dias da celebração da venda, para ser averbado no registro da empresa.
Não sendo feita a averbação, a venda ainda será válida, mas haverá o risco de que algum credor antigo possa, por exemplo, penhorar bens da empresa, ainda que tais bens já sejam do comprador, já que, sem o registro na Junta, o contrato não tem validade perante terceiros – para eles, portanto, é como se o contrato nem existisse.
Nesses casos, o comprador pode até exigir do vendedor o reparo do prejuízo, mas só poderá fazê-lo depois de efetivamente “ter prejuízo”. Isto é: possivelmente enfrentará um longo processo judicial para conseguir ser ressarcido e não poderá fazer nada contra a penhora no momento em que ela estiver sendo realizada.
Por esta razão é que, tão logo seja assinado o contrato de trespasse, a Junta Comercial deve ser informada para averbar a transferência no registro da empresa.
Publicação no Diário Oficial
O Código Civil obriga que, para que o trespasse produza efeitos com relação a terceiros, seja publicado na imprensa oficial, o que gera um custo adicional às partes. Não ocorrendo a publicação, o contrato fica sujeito aos mesmos riscos decorrentes da não-averbação na junta comercial (não tem validade perante terceiros, credores ou devedores).
Notificação aos credores, quitação antecipada de todas as dívidas, ou prova de solvência
Essa é a mais “pesada” burocracia envolvendo o trespasse, diz respeito às dívidas relativas ao estabelecimento. O trespasse não pode ser uma forma de evitar o pagamento de dívidas, razão pela qual os credores da empresa devem estar seguro de que não serão prejudicados com a operação.
Isso pode ser feito de três formas. A primeira delas é a prova de solvência do vendedor: ele deve demonstrar que possui patrimônio, além do estabelecimento que está sendo vendido, para quitar todas as dívidas anteriores.
Caso o vendedor não possua outros bens (imóveis, veículos etc.) em seu nome além das cotas da empresa, esses credores deverão concordar com o trespasse – essa é a segunda forma. Se não houver essa concordância, o credor (que não concordou nem foi notificado) pode até mesmo entrar com pedido de falência contra a empresa, se suas dívidas não forem pagas.
O ponto positivo é que a concordância não precisa ser de absolutamente todos os credores da empresa: são excetuados, por exemplo, os fiscais e trabalhistas – já que tais dívidas são automaticamente repassadas ao novo proprietário com a venda do estabelecimento.
Outra alternativa é quitar todas as dívidas antecipadamente, antes da venda. Naturalmente, esta opção pode se tornar um impeditivo em determinadas circunstâncias (a antecipação do pagamento de um contrato que foi firmado a prazo e por vários anos, por exemplo, pode ser financeiramente inviável).
Em síntese, portanto, para que o trespasse seja regular, o comprador deverá provar documentalmente uma de três coisas: ou (i) que o vendedor possui outros bens para saldar seus débitos, ou (ii) que todas as dívidas foram quitadas, ou (iii) que todos os seus credores (com a exceção dos trabalhistas e tributários) foram notificados e concordam com a venda.
Vale ressaltar que a concordância dos credores pode ser até mesmo implícita: enviada a notificação com AR e não havendo oposição no prazo de 30 dias, pode-se presumir a aceitação. Se possível, o ideal seria que os principais credores participassem da assinatura do contrato junto do comprador, do vendedor e da franqueadora, com a devida listagem de cada débito assumido pelo comprador, de modo dar ainda mais segurança ao negócio.
Caso algum desses requisitos não seja preenchido (solvência do vendedor, ou quitação antecipada das dívidas, ou consentimento dos credores), o trespasse será ineficaz perante terceiros (e/ou credores).
Contabilização dos débitos existentes
A lei prevê expressamente que o comprador só se responsabilizará por débitos anteriores ao trespasse se eles forem devidamente contabilizados. Trata-se de cautela a ser tomada pelo vendedor, uma vez que, caso alguma dívida seja “esquecida” da lista, ele responderá por ela mesmo que tenha vendido o estabelecimento já há anos.
No mais, se corretamente contabilizados todos os débitos, o vendedor ainda permanecerá obrigado ao pagamento dos débitos vencidos (e contabilizados) pelo prazo de 1 ano a partir da publicação do trespasse no Diário Oficial, e pelos débitos a vencer pelo prazo de 1 ano a contar do respectivo vencimento.
Todas essas medidas servem para delimitar responsabilidades e, se forem tomadas, dificilmente haverá espaço para discussão acerca desses limites, especialmente por se tratarem de definições da própria lei.
Cumpridos todos esses requisitos, portanto, fica claro para as partes o tamanho dos riscos envolvidos para cada uma delas na operação – e assim definir se o trespasse é viável ou não.
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