No ano de 2021, a Localiza Rent a Car chamou atenção no mercado brasileiro ao propor que dois de seus executivos recebam direitos equivalentes a cerca de R$ 200 milhões em ações da companhia ao longo de 10 anos, a título de remuneração, um grande exemplo de incentivos de longo prazo.[1]
Para isso, será observado um cronograma, que prevê que as ações serão concedidas progressivamente, de modo que os colaboradores terão direito a 10% das ações no 3º ano, 15% ao final do 5º ano, 20% no 7º ano e, constituindo o valor integral, 55% no final desses 10 anos.
Segundo Eugênio Mattar, um dos fundadores da companhia, que deixou a gestão para integrar o conselho, a aprovação desse plano foi motivada pela ideia de que “os administradores tenham uma participação acionária relevante ao longo do tempo para fazerem da Localiza seu projeto de vida pessoal e patrimonial.”
É justamente esse alinhamento de interesses, somado à busca pela retenção de talentos, uma das principais bases para a inclusão de Incentivos de Longo Prazo como parte integrante do plano de remuneração estratégica dos colaboradores, juntamente com os Incentivos de Curto Prazo.
Tais incentivos, cada vez mais recorrentes em companhias de alto renome, podem ser baseados em ações, a exemplo das stock options, ações restritas, performance shares e matching shares, ou baseados em dinheiro, como o modelo de bônus a longo prazo e de phantom options.
Stock options
Ao adotar o modelo de stock options como forma de incentivo a longo prazo, a empresa concede ao colaborador o direito de comprar ações por um preço pré-determinado. Esse direito poderá ser exercido no futuro, ao fim de um prazo que também será definido previamente. Assim, com a valorização do ativo, o colaborador terá seu ganho baseado na diferença positiva entre o valor de compra e o valor de venda.
Suponhamos que a empresa X concede a seus colaboradores o direito de adquirir, daqui a 4 anos, ações da companhia pelo preço que valem atualmente, equivalente a R$ 100,00. No fim do prazo determinado, os beneficiados que exercerem sua opção poderão comprar as ações pelo preço corrente à época e vendê-las pelo preço de mercado, qual seja R$ 300,00. Aqui, haveria um ganho de R$ 200,00 por ação.
Caso não houvesse valorização, o programa de incentivo não teria qualquer efeito. Exatamente por isso é que se trata de um modelo em que é considerada somente a valorização de ações, já que, se isso não ocorrer, nenhum proveito financeiro será obtido.
Ações restritas
Diferentemente das stock options, no modelo de ações restritas, o ganho do colaborador não está vinculado somente à valorização dos ativos, mas ao valor integral deles.
Tratam-se dos parâmetros utilizados pela Localiza em seu plano de remuneração dos executivos a longo prazo: a empresa concede ações sem custo ao colaborador, apenas sob a condição de que seja cumprido um prazo de carência – o chamado vesting. Esse período, que geralmente varia de 2 a 5 anos, equivale ao tempo necessário para que sejam, efetivamente, adquiridos os direitos.
No caso em que citamos da companhia de aluguel de veículos, o vesting está relacionado ao tempo de permanência do executivo na empresa, que lhe garante a aquisição gradual das quotas societárias pretendidas.
Aqui, o recebimento das ações não está vinculado a nenhuma outra condição senão ao cumprimento do período combinado. Então, é certo que o colaborador receberá a participação que lhe foi prometida, desde que continue na companhia pelo tempo que se espera. É essa a característica que torna o incentivo por ações restritas um relevante mecanismo para a retenção de talentos.
Ações por performance/performance shares
O modelo de ações por performance também é caracterizado pela concessão de ações da companhia sem custo aos executivos.
Apesar da grande semelhança com o modelo de ações restritas, a diferença reside justamente na condição à qual o recebimento desses incentivos está atrelado. Enquanto a concessão das ações restritas está condicionada tão somente ao cumprimento de um determinado prazo de carência (o vesting), a das ações por performance depende também do atingimento de metas a longo prazo, ou seja, de métricas de performance, que normalmente estão associadas à criação de valor para a empresa.
Geralmente, existe uma curva de premiação pela performance, o que significa dizer que se a performance for superior ao esperado, o número de ações a serem recebidas também será maior. Por outro lado, se a performance deixar a desejar, a quantidade de ações também será inferior.
Em 2021, o CEO da Apple, Tim Cook, recebeu uma compensação equivalente a quase 100 milhões de dólares. Desse montante, grande parte foi paga através da concessão de um pacote de ações da companhia, no valor de 82 milhões de dólares, as quais devem começar a ser adquiridas no ano que vem. A aprovação desse plano foi baseada na valorização da Apple em mais de 1.000% desde que Cook assumiu a direção da companhia, o que revela uma performance excepcional. [2]
Matching shares
Neste modelo, o colaborador tem a oportunidade de investir uma parte do que recebeu a título de bônus líquido na compra de ações da empresa pelo preço a que estão sendo negociadas na bolsa, sem qualquer desconto ou isenção.
As ações adquiridas deverão ser mantidas em posse deste colaborador durante um período de carência, ao final do qual será concedida uma contrapartida em novas ações ou em dinheiro.
Foi essa a alternativa recentemente adotada pela produtora de embalagens em papel Klabin para incentivar, a longo prazo, seus 17 mil colaboradores, que passaram a ter a opção de converter 10% do bônus recebido no programa de participação nos lucros e resultados em ações da companhia. Ao fim do prazo de carência de 3 anos, em que os colaboradores deverão manter posse das ações, a empresa concederá uma contrapartida, o matching, com proporção de 1 para 1. Ou seja, a cada ação adquirida pelo colaborador, a companhia concede uma nova ação. Então, no momento do resgate, ele terá 2 vezes o número de ações que adquiriu anteriormente, o que equivale a um retorno de 100%. [3]
Performance matching shares
Existe, ainda, uma variação deste modelo: o de performance matching shares, em que o matching não é garantido, de forma que depende diretamente do desempenho do colaborador.
A título de exemplo, se a performance do funcionário atender aos parâmetros esperados, o matching é de 1 para 1 (recebe uma ação para cada uma comprada). Porém, se sua atuação for aquém das expectativas da companhia, o matching é inferior, correspondendo a 0,5 para 1 (é concedida meia ação para cada uma comprada); enquanto um desempenho excepcional pode garantir ao colaborador um matching equivalente a 2 para 1 (duas ações recebidas para cada uma comprada).
Importante salientar que o modelo de matching shares tem como uma de suas características fundamentais a voluntariedade, ou seja, nenhum colaborador é obrigado a investir parte de seu bônus ou participação nos lucros em ações da companhia. Entretanto, na prática, essa adesão é praticamente obrigatória, principalmente para os executivos de alto escalão, como membros da diretoria. Isso porque trata-se de um investimento muito rentável, com grande retorno em um curto período de tempo, e com baixíssimo risco, vez que as ações da companhia teriam que ser desvalorizadas em mais do que 50% para que o colaborador começasse a ter prejuízo. Logo, se nem mesmo os diretores executivos enxergarem o plano como uma boa oportunidade de negócio, os investimentos na companhia passariam a ser vistos com maus olhos pelo mercado.
Além dessas opções, para que colaboradores excepcionais tenham a possibilidade de crescimento empresarial, há, ainda, incentivos baseados em dinheiro, utilizados, em geral, por empresas de capital fechado ou pelas de capital aberto que não demonstram interesse em traçar planos baseados diretamente em ações, de forma que o colaborador não se torna, de fato, acionista. Nesse sentido, os incentivos mais comuns são os bônus de longo prazo e as ações/opções fantasma (phantom options).
Phantom Options (Opções Fantasmas)
O funcionamento deste modelo ocorre de forma semelhante ao que se dá nas Stock Options, porém os efeitos positivos que se apresentam para os cotistas são apenas replicados para o recebimento do incentivo, de forma que não há alteração no quadro societário da empresa, e o resgate ocorre em dinheiro, diferentemente do que ocorre nos incentivos por ações.
Caso no momento de exercício do benefício o preço da ação seja inferior àquele do momento da outorga, não há pagamento.
Considerando, por exemplo, que ocorra a outorga de opções fantasma a R$ 10,00 como preço de exercício e após o período de vesting as mesmas estejam valendo R$ 15,00 cada, o colaborador receberá R$ 5,00 por ação inicialmente outorgada caso exerça suas opções neste momento. Se não o fizer, terá um prazo de cinco anos para exercer e seus ganhos estarão ligados ao valor das ações no momento de exercício do benefício. Ou seja, se o preço das ações estiver abaixo de R$ 10,00, o colaborador não receberá nenhum valor e tampouco terá prejuízo.
Como escolher o modelo mais adequado para a minha empresa?
Não há uma resposta padrão que determine o melhor tipo de ILP a cada negócio. Além de considerar se a empresa possui ou não capital aberto e os riscos que se está disposto a correr, no sentido tributário, por exemplo, se faz necessário levar em conta outros aspectos, como o momento do negócio, pensando tanto no presente quanto no futuro da empresa, para que o incentivo possa ser mantido a longo prazo, bem como a cultura corporativa, que determina o nível de aceitação do ILP pelos colaboradores.
Também se mostra importante averiguar a necessidade de retenção do funcionário a receber o incentivo, a depender de sua performance, pensando, ainda, na competitividade da remuneração a ser oferecida, vez que o colaborador pode ser uma peça chave para o alcance de resultados de longo prazo.
O que mais eu preciso saber?
Desenhar planos de ILP inclui desafios, tanto em relação ao estabelecimento de metas de longo prazo e à complexidade do gerenciamento do plano, quanto pela insegurança jurídica voltada à tributação de alguns incentivos (em especial das stock options).
Além disso, há obstáculos à atração e retenção, de forma que deve haver clareza na elaboração do plano quanto à performance esperada, visando o equilíbrio para que as metas não sejam muito distantes a ponto de desestimular o colaborador, mas de forma que tragam benefícios efetivos à empresa.
As métricas de desempenho são variadas e também podem estar ligadas às necessidades e objetivos da empresa, valorizando-se a performance ou um indicador específico que sirva como parâmetro e que precisa atingir patamar mais elevado na companhia.
Ainda, a premiação target, da mesma forma que ocorre no ICP, varia a depender do nível hierárquico ocupado, sendo que cargos C-level costumam apresentar incentivos mais elevados.
Conclusão
É notável a gama de possibilidades existente para levar à melhoria do desempenho da empresa e da performance dos colaboradores. Cabe a cada companhia definir suas estratégias e seus objetivos para traçar os melhores planos de incentivos, construindo-os de forma adequada nos âmbitos legal, fiscal e também considerando as necessidades dos colaboradores, conforme a cultura e a meta organizacional, vez que Incentivos de Longo Prazo vêm sendo cada vez mais utilizados e, consequentemente, não se apresentam mais apenas como diferencial, mas como estímulos essenciais à competitividade do negócio.
[1] https://www.capitalreset.com/r-1-bi-em-20-anos-o-plano-da-localiza-para-construir-uma-nova-geracao-de-fundadores/
[2] https://www.capitalreset.com/os-us-100-mi-do-ceo-da-apple-e-o-abismo-salarial-nas-empresas/
[3] https://valor.globo.com/empresas/noticia/2022/03/24/klabin-amplia-programa-de-acoes-para-100-do-quadro.ghtml
Keywords:
remuneração; incentivo; performance; desempenho; bônus; ações; recompensa.
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