Boa leitura!
Artigo:
No final de março deste ano foram publicadas duas medidas provisórias (1.108 e 1.109), cujos objetivos foi regulamentar o teletrabalho, ou – nos termos da nova norma – a prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, que, por sua natureza, não se configure como trabalho externo.
No home-office e na empresa, ao mesmo tempo!
Já de início nos deparamos com uma grande novidade. É que antes dessas medidas provisórias, havia grande discussão sobre qual a frequência com que o funcionário poderia comparecer na empresa para que não fosse descaracterizado o regime de teletrabalho.
É o caso do regime híbrido, onde o funcionário trabalha parte da semana em casa, parte da semana na empresa.
Agora ficou claro: o teletrabalho está configurado quando o funcionário presta serviços fora das dependências da empresa, de maneira preponderante ou não. Ou seja, de acordo com a nova regra, tanto faz se o funcionário passa dois dias em casa e três em home-office, ou 4 dias no presencial e 1 no remoto.
De acordo com estudo realizado pela WeWork[1], em parceria com a HSM e apoio da Egon Zehnder, que envolveu mais de dez mil lideranças e executivos na Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e México, cerca de 81% dos entrevistados apontou que o regime híbrido é o modelo mais indicado para o mercado de trabalho no pós-pandemia.
Dessa forma, as empresas podem passar a adotar os regimes híbridos de teletrabalho e trabalho presencial com mais segurança jurídica, podendo usufruir dos benefícios de ambos os modelos.
Teletrabalho sem controle de jornada, pode?
Por outro lado, outra grande novidade é que agora o funcionário que estiver em regime de teletrabalho, pode prestar serviços tanto por jornada ou por produção ou tarefa. Mas como isso vai funcionar na prática?
Na prática a empresa pode contratar um funcionário em regime de teletrabalho para cumprir uma determinada jornada de trabalho, ou contratá-lo para a prestação de serviços por produção ou tarefa, sem a necessidade de sejam controlados os horários de trabalho, cabendo ao funcionário, neste caso, apresentar e entregar os serviços contratados.
Reforçando, contudo, que antes de se adotar um modelo ou outro, é importante averiguar se o serviço executado pelo funcionário pode ser medido por produção ou tarefa, ou não.
Lembrando, por fim, neste segundo caso ainda valem todas as demais regras contidas na CLT.
E se o funcionário usar os equipamentos fora da jornada de trabalho, vou pagar horas extras?
Outro tema relevante abordado pelas novas medidas é em relação ao uso de equipamentos tecnológicos fora da jornada de trabalho. Aqui neste ponto a nova regra é clara: “O tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, e de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho, fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho”.
Ou seja, agora, caso o funcionário utilize os equipamentos, infraestrutura, software ou qualquer ferramenta digital ou aplicativos de internet, necessários para o teletrabalho, fornecidos ou não pela empresa, não vai constituir tempo à disposição do empregador.
E os nômades digitais, como ficam?
Talvez um dos temas mais polêmicos trazidos pela nova medida fique por conta do entendimento sobre a legislação aplicável no caso dos funcionários em regime de teletrabalho. Isso porque a nova regra determina que as disposições previstas na legislação local ou em normas coletivas serão aplicadas de acordo com a base territorial do estabelecimento de lotação do funcionário.
Isso significa que não importa onde a matriz da empresa esteja localizada, a legislação aplicável aos funcionários em regime de teletrabalho será aquela do local do estabelecimento empresarial ao qual o contrato de trabalho estiver vinculado.
Mas e se o funcionário for para fora do Brasil?
Igualmente, as medidas provisórias trouxeram fim a uma dúvida recorrente dos empresários nesses últimos anos de pandemia, especialmente com o surgimento da figura do nomadismo digital: “Meu funcionário está em home-office e viajou para o exterior, e agora? O que vai ser aplicado, a legislação brasileira ou a estrangeira?”.
Agora a regra é clara: ao contrato de trabalho do empregado admitido no Brasil que optar pela realização de teletrabalho fora do território nacional, aplica-se a legislação brasileira, excetuadas as disposições constantes na Lei nº 7.064/82 (Lei do Expatriado), salvo disposição em contrário estipulada entre as partes.
Isto é, não se tratando de funcionário expatriado (trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviço no exterior), ou salvo se empresa e funcionário estipularem outras condições, a legislação aplicável é a brasileira.
Lembrando que o empregador não será responsável pelas despesas resultantes do retorno ao trabalho presencial, quando o funcionário optar por realizar teletrabalho em localidade diversa daquela que ficou prevista no contrato.
Já que o funcionário está trabalhando de casa, posso chama-lo a qualquer hora?
Embora não tenha tratado expressamente sobre o direito à desconexão (i.e, o direito ao “desligamento” do ambiente de trabalho físico ou virtual), a nova regra é de que o acordo individual poderá dispor sobre os horários e os meios de comunicação entre empregado e funcionário, desde que assegurados os repousos legais.
Em outras linhas, é dizer que o próprio acordo individual estabelecendo o regime de teletrabalho, já pode estabelecer em quais horários e meios a empresa poderá se comunicar com o funcionário, assegurando que isto não ocorra durante os períodos de repouso.
E para concluir…
As medidas provisórias tem a intenção de trazer maior segurança jurídica às empresas que optarem por adotar regimes de teletrabalho ou trabalho híbrido, adequando a legislação trabalhista a esta nova realidade que é a descentralização do local de trabalho.
É importante, contudo, que os empresários fiquem atentos na hora de formalizar eventuais acordos individuais, aditivos contratuais ou mesmo o próprio contrato de trabalho – as regras do jogo importam e devem ser observadas.
Estas foram as principais alterações conferidas pelas novas medidas provisórias. Porém não foram as únicas.
Para resumir as novidades, trazemos o seguinte quadro:
O comparecimento, ainda que de modo habitual, às dependências do empregador para a realização de atividades específicas, que exijam a presença do empregado no estabelecimento, não descaracteriza o regime de teletrabalho ou trabalho remoto. |
O empregado submetido ao regime de teletrabalho ou trabalho remoto poderá prestar serviços por jornada ou por produção ou tarefa. |
O regime de teletrabalho ou trabalho remoto não se confunde e nem se equipara à ocupação de operador de telemarketing ou de teleatendimento. |
O tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, e de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho, fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho. |
Fica permitida a adoção do regime de teletrabalho ou trabalho remoto para estagiários e aprendizes |
Aos empregados em regime de teletrabalho aplicam-se as disposições previstas na legislação local e nas convenções e acordos coletivos de trabalho relativas à base territorial do estabelecimento de lotação do empregado. |
Ao contrato de trabalho do empregado admitido no Brasil que optar pela realização de teletrabalho fora do território nacional, aplica-se a legislação brasileira, excetuadas as disposições constantes na Lei nº 7.064, de 6 de dezembro 1982, salvo disposição em contrário estipulada entre as partes. |
Acordo individual poderá dispor sobre os horários e os meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que assegurados os repousos legais. |
A prestação de serviços na modalidade de teletrabalho ou trabalho remoto deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho. |
O empregador não será responsável pelas despesas resultantes do retorno ao trabalho presencial, na hipótese do empregado optar pela realização do teletrabalho ou trabalho remoto fora da localidade prevista no contrato, salvo disposição em contrário estipulada entre as partes |
Os empregadores deverão conferir prioridade aos empregados com deficiência e aos empregados e empregadas com filhos ou criança sob guarda judicial até quatro anos de idade na alocação em vagas para atividades que possam ser efetuadas por meio do teletrabalho ou trabalho remoto |
As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação de teletrabalho ou do trabalho remoto e as disposições relativas ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da data da mudança do regime de trabalho |
Na hipótese de o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos ou a infraestrutura necessária e adequada à prestação de teletrabalho ou de trabalho remoto: o empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e custear os serviços de infraestrutura, que não caracterizarão verba de natureza salarial; ou, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador, na impossibilidade do oferecimento do regime de comodato. |
[1] Disponível em: https://www.wework.com/pt-BR/ideas/research-insights/research-studies/as-pessoas-querem-voltar-ao-espaco-de-trabalho-mas-nao-da-mesma-forma
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